quinta-feira, 10 de abril de 2008

O Marcador


Eu não conseguia parar de rir. Estávamos ali deitados na cama e eu te irritando com minha risada quase radioativa. Você já tinha perguntado umas três vezes, com aquele tom de quem tá puto, mas que também quer rir. Eu repetia as mesmas palavras, "Não sei, não sei. Não sei explicar". Eu sabia. Na verdade eu claramente sabia do que estava rindo, e as imagens me vinham com cada detalhe na mente. Isso dilacerava as minhas sinapses. Não conseguia controlar meus impulsos.

Não queria que você entendesse mal. É, era isso. Eu não conseguia encontrar palavras que fossem explicar claramente porque aquilo era tão hilário. Não era pelo presente, pelo esforço, pelo ciúme. Era simples e puramente pela razão. A razão do trabalho, da precisão do corte. A razão do agrado, de se fazer pequeno por ser algo materialmente pequeno (o que as pessoas acreditam que se torna sentimentalmente grande). Era isso que me fazia inebriar o ambiente com a graça.

Considerando essa minha mente, toda diabólica, dando corda ao humor fétido, criou imagens. Eu podia vê-lo escolhendo, cortando, imprimindo, cortando, plastificando, cortando e pensando em você. Aquilo tudo me fazia imaginar sobre o quanto somos ridículos quando nos apaixonamos.

Me contive com todo aquele riso e falei, palavra por palavra, tentando chegar mais próximo da possível realidade. As primeiras tentativas, basicamente frustrantes, me faziam perceber que eu estava nos enrolando com seus argumentos errados. Depois da terceira tentativa, talvez, de forma mais direta, eu disse. Você, tentando disfarçar a surpresa, pensou por alguns segundos (enquanto eu me controlava para manter a seriedade) e teceu palavras mais sujas que as minhas imagens.

Um turbilhão de algo que não posso explicar subiu pela minha garganta, e eu posso dizer, devo ter acordado toda a vizinhança. Éramos terríveis. Terríveis juntos. Mas aquela imagem não saia da minha mente. Escolhendo, escrevendo, imprimindo, cortando, plastificando, medindo, precisando, cortando. Na carta, no correio, no me-desculpe-por-não-estar-perfeito, nas nossas mãos, nas nossas mentes. Na minha observação ordinária, que via um eu-te-amo-mas-não-conta-a-ninguém. Na minha observação ordinária, que percebeu um segredo óbvio e não conseguia parar de imaginar o quanto aquilo tudo poderia ser hilário. O quanto a paixão poderia ser hilária.

Um comentário:

Anônimo disse...

Crises de riso são sempre legais..mas não acho a paixão hilária..ela é bizarra e corrosiva..um problema extra na vida de qualquer um