quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Outono



- O que foi?

Ele perguntou, mantendo aquele rosto sereno de rapaz refinado, corrompido pela doce curiosidade a respeito do meu olhar perdido.

- Nada – eu disse pausadamente – Só estava lembrando de um garoto. Estivemos juntos apenas uma vez. Pelo que me recordo, ele chorou. Uma lágrima apenas. Achei que com o tempo entenderia. Ele disse que estava feliz. Só isso. Naturalmente eu não acreditei, mas consenti com a cabeça e nunca compreendi.

Essas questões incompletas costumavam me pegar em fins de tarde como estes: frios, chuvosos e em um lugar distante. E então me perdia no tempo pensando, pensando e pensando. Virei para seu rosto, enfim, ensaiando um sorriso amarelo, esperando alguma reação não tão amigável.

Nada. Depois da confissão, o silêncio. Ele permaneceu me olhando, intrigado. Embora soubesse engolir os sentimentos como ninguém, eu tinha plena certeza do que se passava por trás daqueles olhos. Ele suplantava a beleza de seus atos com toda aquela frieza. E eu gostava. Gostava daquele desafio de cutucar a onça com vara curta.

Abriu a boca como se fosse discordar, mas pensou bem e cerrou os lábios, voltando à distância glacial de sua leitura sobre desastres guerrilheiros de 1945.

2 comentários:

Zeppelin disse...

Eu diria que é um fragmento promissor... siga em frente.

Anônimo disse...

Lágrima de felicidade ou contradição? Mudanças repentinas de assunto nunca são legais..e geralmente botam pra pensar..E MUITO :)